Você já ouviu falar do Recanto da Sereia, em Guarapari? E da Praia d’ Ulé, localizada naquele bairro e que hoje é o paraíso para surfistas de todo o País? O local voltou a ganhar destaque, mas por outro motivo não ligado ao esporte: por iniciativa do deputado estadual Fabrício Gandini (Cidadania), a Assembleia Legislativa vai votar o Projeto de Lei 70/2023, que dispõe sobre a realização de um plebiscito em que os cerca de 6 mil moradores vão decidir se querem ficar em Guarapari ou passar a pertencer a Vila Velha.
De acordo com o presidente da Associação de Moradores da Praia D’ Ulé e Amigos D’ Ulé, Hermenegildo Rembisk, o bairro foi abandonado pelo prefeito de Guarapari, Edson Magalhães (PSDB), e serviços como: drenagem, pavimentação, rede de esgoto e urbanismo não são realizados.
“Com regularidade, a Prefeitura de Guarapari somente disponibiliza serviço de recolhimento domiciliar de lixo, que não é diário, e a cobrança do IPTU. A Saúde se resume a um posto médico precário, com a presença semanal de médico e sem a oferta regular de medicamentos. Para serem atendidos, os moradores têm de se deslocar até Muquiçaba, já que o posto mais perto, que fica em Vila Velha, não atende por causa do endereço dos pacientes, que é do município vizinho”, enumerou o líder comunitário.
Segundo ele, por mais absurdo que possa parecer, em pleno século XXI, não há serviço de transporte público municipal, calçamento nas ruas, urbanismo, galerias fluviais dignas e faltam até mesmo escolas no bairro. Na praia, não há salva-vidas, chuveiros ou banheiros químicos. As ruas são só poeira e lama. Um cenário de caos.
Hermenegildo conta que o bairro teve início no começo dos anos 90 e foi chamado inicialmente de Praia Sol. Ele explica que, com a chegada da Rodosol, o objetivo era que a rodovia sob concessão se estendesse até Guarapari, mas o bairro acabou ficando antes da praça do pedágio para quem vai em direção ao Sul.
“Nós não temos o direito de ir e vir. Temos de pagar pedágio para ir até o centro de Guarapari. Esse foi o primeiro erro. Hoje, tudo que nós precisamos aqui: saúde, educação e emprego, precisamos ir até Vila Velha ou Vitória. Mas isso leva a um grande problema: como o nosso endereço é de Guarapari, se formos procurar um médico, um posto de saúde em Vila Velha, não somos recebidos porque o nosso endereço é de Guarapari”, explicou.
De acordo com a liderança comunitária, o mesmo ocorre quando um filho tem de procurar emprego. “Isso dificulta porque o endereço é de Guarapari. Tudo nós procuramos em Vila Velha, mas pagamos nossos impostos para Guarapari. Isso não está certo! Pagamos para Guarapari, mas não usufruímos da educação, da saúde… Guarapari só tem o papel de recolher. Os serviços não são realizados”, reclamou.
PROTESTOS
O clima de insatisfação levou os moradores a fazerem protestos na Rodovia do Sol, como forma de chamar atenção, já que, segundo reclamam, a prefeitura da Cidade da Saúde sequer manifesta interesse em ouvi-los. Na última quinta-feira (2), Hermenegildo foi à Câmara Municipal pedir a ajuda dos vereadores para amenizar os problemas do bairro, mas até agora nada foi resolvido, o que levou a parte da comunidade a apoiar a realização do plebiscito.
“Ouvi os moradores e a reclamação constante é que o bairro está esquecido pelo poder público. Há pessoas favoráveis a que o Recanto da Sereia pertença a Guarapari e, também, aqueles que defendem a migração para Vila Velha. O consenso é que o bairro está abandonado, do ponto de vista da saúde pública, educação e tratamento de esgoto. Resolvi estudar o assunto, e, a pedido da comunidade, apresentei a proposta de plebiscito”, conta Gandini.
O parlamentar explicou que as legislações federal e estadual apontam que cabe à Assembleia Legislativa realizar o plebiscito, caso haja interesse de parte dos moradores. A partir do resultado favorável à mudança política-administrativa para Vila Velha, os estudos técnicos, econômicos e sociais seriam realizados.
“Caso a lei seja aprovada, teremos uma novidade: a Assembleia terá de estar à frente do processo. Não sei se o Legislativo já fez. Mas é uma atribuição nossa. Para o plebiscito, deveremos pedir auxílio ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE) com o fornecimento de urnas eletrônicas. Precisamos entender qual será a vontade dos moradores. Tem gente a favor e contrária, mas o tema central é o abandono. Não creio que haveria essa avaliação, se não ocorresse tamanho abandono”, declarou Gandini.
O plebiscito ainda não tem data para entrar na pauta para ser votado pelos deputados. Gandini revela, porém, que quer saber se, com o projeto em tramitação, o prefeito de Guarapari terá ou não o interesse de inverter a situação de abandono ou se ele deixará a população conduzir o processo de independência do bairro, indo para outro município.
“Também acredito que, se a vontade for migrar para Vila Velha, a Câmara Municipal também terá de aprovar. Se a decisão for continuar em Guarapari, o debate deverá ser mantido para que ocorra o atendimento das necessidades básicas. Mas o debate será importante para saber qual é a intenção do prefeito. O município precisa atender de forma decente aos seus cidadãos”, alfinetou o parlamentar.
Atualmente, o recolhimento de impostos, como o pagamento do IPTU, hoje é de responsabilidade de Guarapari, mas, caso a mudança ocorra, o recurso iria para Vila Velha, causando perda de receita para a Cidade Saúde.
“E, mais do que isso, temos ali um dos ativos mais importantes: o atrativo turístico enorme, que é uma praia linda, que está contaminada pelo esgoto, por falta de efetividade da própria prefeitura de cobrar a concessionária do município, no caso a Cesan”, explicou Gandini.